O Corte do Zumbi

março 27, 2014

NED I

Filed under: Uncategorized — binhoo @ 12:09 am

Ned era alguma coisa diferente. Hoje estava exausto. Desta vez não teve pesadelos nem dormiu. Cansado da claustrofobia de seu destino, vagava de volta pra casa. O fardo da existência era enorme. Colossal. Sentia-se empurrado pelo vento andando devagar pela rua 7. Pesado com o suor frio de seu mundo, vazio e inóspito. Longínquo de tudo. Ele viu um pássaro cantando. O céu estava carregado e mesmo assim aquilo cantava. Ele contemplou o pássaro. Percebeu que o amor estava lá mas não podia alcança-lo. Nessa ele virou a esquina e avistou uma pedra. Fustigado em sua caminhada percebeu que mesmo amando, não haveria forças suficientes pra sustenta-la. O tempo é curto. Desanimado consigo mesmo, antes de chegar na fonte em frente ao açougue de aves, viu que havia um jardim e ninguém o cultivava. Deveria ser uma casa abandonada. Observou uma enorme flor de maracujá solitária no matagal, e tentou apanha-la. Ao toca-la, sentiu o corte frio da solitude dos espinhos em sua alma. Olhou seu dedo e havia sangue. Neste momento sentou na guia da calçada. Acendeu seu cigarro amassado e contemplou o momento. Ned compreendeu o amor.

Passado alguns minutos. Ou horas. Não sabia ao certo. Sabia apenas o que tinha que fazer. Ned se levantou. Jogou a bituca fora. Estapeou a bermuda. Sentia algo diferente. Desejou isso. Refez seus passou. Apanhou a flor e não se importou com o corte. O sangue jorrou. Segurou firmemente desta vez. Com o pouco de força que ainda restara viu suas veias saltarem ao levantar a pedra. Avistou o pássaro. E lá estava aquela merda cantando. Não hesitou. A pedra voou e acertou a nuca do passarinho. Não deu tempo. O pássaro caiu morto no chão. Dava pra ver os olhos saltados pra fora com o impacto. Com as mão sujas de sangue. Ajoelhou na terra e cavou um buraco. Enterrou seu canto ali. Sustentou a pedra no tumulo. E indiferentemente deixou a flor tocar a lápide. Ned compreendeu o que havia se tornado.

Acendeu mais um amassado cigarro.

Blog no WordPress.com.